quinta-feira, 18 de outubro de 2012


Orquestras e casos de iniciativas sociais em situações de conflito, por Francesco Valente

Vedran Smailovic na foto (marylea blog)
Se a cultura entendida como expressão de artes, drama, dança, filmes, desporto e música nunca provocou conflitos, muitas vezes a questão das diferenças culturais foi utilizada para justificar disputas políticas e económicas.
A cultura tem de ser considerada um elemento para promover a paz: neste quadro o Akiko Fukushima  indica-nos situações em que a música foi utilizada neste sentido.
Durante a guerra na Bosnia, o violoncelista Vedran Smailovic, o “violoncelista de Sarajevo”,  tornou-se o símbolo da coragem e resistência não violenta frente ao horror da violência e do sofrimento humano.
A Orchestra Without Borders, liderada por Mayo Shono, ofereceu instrumentos para crianças em zonas de conflito, concertos e workshops. Daniel Barenboim, israelita, com Edward Wadie Said, palestiniano, fundaram a West-Eastern Divan Orchestra em ’99, em ocasião do 250º aniversário do escritor alemão Goethe, Barenboim convidou mais de 70 jovens músicos de Israel, Palestina e outros estados árabes como Jordânia, Líbano, Síria, Egipto, Turquia e Irão.
Segundo Barenboim, a orquestra luta contra a ignorância e o resultante conhecimento servira para começar a paz entre Israel e Palestina. Said definiu a orquestra como uma ‘ponte para a coexistência’ e, segundo Barenboim, o objectivo da orquestra é o de mostrar aos jovens como a solução militar pode ser inadequada.
O sonho de Barenboim é o de trazer tal orquestra a todos os países dos músicos membros, mas tem anualmente imensos problemas, devido ao conflito e a contrastes por parte das autoridades políticas.
Balkan Chamber Orchestra, sob a direcção do Toshio Yanagisawa, fundada em 2007, reúne músicos sérbios, macedones, albaneses. Foi a primeira orquestra multi-étnica depois da guerra de Kosovo. O maestro afirma que a orquestra não é um instrumento para conseguir a reconciliação, mas para a representação de uma riqueza comun.
As orquestras acima citadas tiveram que lidar com situações políticas e regionais particulares, onde os próprios maestros tiveram que assegurar e fazer-se garantes da segurança física dos músicos membros sob ameaça de hostilidades políticas e étnicas, além de lutar contra a falta de preparação técnica, por vezes por parte de músicos que não tem acesso a uma formação digna no seu habitat.
Os maestros vêem na orquestra um microcosmo da comunidade, onde cada membro dá o seu contributo, com o objectivo de apresentar música com a melhor qualidade possível ao público, apesar disto poder significar o superamento por parte dos músicos de traumas devidos ao seu passado, neste contexto, às memórias do conflito.
As performances efectuadas em zonas críticas de guerra, que tiveram um grande impacto nas comunidades (Ramallah, Mitroviça, Sarajevo etc.), deram a estes músicos também a possibilidade de conseguirem um futuro como músicos profissionais internacionais.
As actividades culturais podem claramente contribuir para a resolução de conflitos, e são significativos ingredientes para a prevenção de conflitos, resolução, manutenção e construção da paz. A cultura pode efectivamente ajudar e implementar a comunicação entre pessoas e membros de grupos hostis.

Francesco Valente (Músico*, Compositor, Autor italiano a residir em Lisboa, Mestrando na área de especialização em Etnomusicologia)
*Francesco Valente é músico em Orquestra Todos, Tora Tora Big Band, Terrakota, Quinteto de jazz (com Guto Lucena-Sax, Johannes Krieger-Trompete, Iuri Gaspar-Piano, Miguel Moreira-Bateria), entre outros
nota: MoFrancesco Quintetto, aqui: https://mofrancescoquintetto.bandpage.com/